Apesar do aumento da área de vinha na sub-região do Lima (situação extensiva às restantes oito sub-regiões da Região Demarcada dos Vinhos Verdes), a falta de uvas tintas é um problema identificado no território. Se há décadas a “produção de [vinhos] tintos representava uma fatia significativa da oferta”, a verdade é que, desde a década de 90 do século passado, “os vinhos brancos passaram a suplantar a produção de tintos e a tendência tem-se acentuado”, frisa o enólogo João Pereira, da Adega Cooperativa de Ponte da Barca e Arcos de Valdevez (ACPBAV).
“Sabemos que o consumo do tinto tem vindo a diminuir, em contrapartida, a procura dos vinhos rosados (provenientes das uvas tintas) está a aumentar. Precisamos de mais uvas das castas tintas, não necessariamente da casta Vinhão, mas de outras castas com aptidão para vinhos rosados, sem tanta cor, pois o território está a perder potencial na área das castas tintas”, alerta o técnico da ACPBAV (agora também denominada de ‘Barcos Wines’).
A este respeito, Jorge Sousa Pinto, enólogo da Quinta do Tamariz, é de opinião que, “em termos de castas, a aposta no Espadeiro é a mais indicada, pois é a que melhor se adapta às alterações climáticas, com existência de mais horas de sol e invernos cada vez mais tardios a ajudar na sua maturação. Também a casta Padeiro se revela interessantíssima para vinhos rosados”, revelou o técnico ao jornal Bons Verdes.
Sem surpresa, a problemática das alterações climáticas está a mobilizar cada vez mais a comunidade científica, além de determinar a possibilidade de expandir a vinha para norte e para as áreas montanhosas. “Devido às mudanças do clima, há agentes do ramo a investir nos territórios do Vale do Lima e do Vale do Minho, porque os players sabem que a escassez de solos cultiváveis (com água) vai ser no futuro o grande estrangulamento da produção vinhateira, por isso é que muitos deles se estão a deslocar de sul para norte, onde encontram áreas de sustentabilidade, produtividade e fotossanidade”, justifica João Pereira, segundo o qual, a nível europeu, “o Reino Unido é cada vez mais um produtor de vinhos”.
Investigadores estudam “aptidão vitivinícola em contexto de alterações climáticas”
Potenciar investimentos, reduzir custos e acrescentar valor foram os motes de uma investigação conjunta que o professor Joaquim Mamede Alonso, da Escola Superior Agrária/ESA (do Instituto Politécnico de Viana do Castelo), apresentou em recente edição dos Encontros Vínicos do Vinho Verde, de Viana do Castelo. O estudo, intitulado “A zonagem e aptidão vitivinícola nas sub-regiões dos Vinhos Verdes em contexto de alterações climáticas”, coloca-se ao serviço da vinha e do vinho, com enfoque nas mudanças do clima, procurando combater ou atenuar os seus efeitos.
“Há diversa investigação no setor do vinho e a ESA, onde estudei, é disso um bom exemplo. Esta instituição oferece-nos ferramentas com as quais é possível fazer testes de aptidão vitivinícola. No projeto em questão, é afirmado que todo o vale do rio Vez se apresenta como um território de excelência para a produção de vinho”, diz João Pereira.
A avaliação, em simultâneo, de vários parâmetros é uma mais-valia. “Através do projeto da ESA, há um conjunto de dados – climatológicos, pluviosidade, temperatura, doenças da videira e carta de solos – que entra num programa e, por essa via, é gerado um algoritmo que define quais as zonas ideais para produzir esta ou aquela casta”, acrescenta o técnico da ACPBAV.
Para João Pereira, “a investigação da ESA é mais um contributo para que o território se afirme em termos de castas através do poder da inovação, por tal facto, sou apologista de que este programa pode ser usado para potenciar a produção de castas tradicionais, designadamente o Loureiro, a Trajadura e o Arinto nos brancos, assim como o Vinhão nos tintos”.
Estação Amândio Galhano é “o maior centro genético do Vinho Verde”
No concelho de Arcos de Valdevez (freguesia de Paçô), a Estação Vitivinícola Amândio Galhano (EVAG), centro de experimentação e investigação criado pela Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes há perto de duas décadas, promove ações e projetos de experimentação de apoio à vitivinicultura (cultivo da vinha e fabricação do vinho).
Com um espaço de vinha dedicado às castas autóctones, a EVAG (antiga Quinta de Campos do Lima) possui “o “maior centro genético do Vinho Verde e através dela estamos empenhados em recuperar algumas das castas minoritárias que já desapareceram (ou tendem a desaparecer) devido aos movimentos gerados no setor. É muito importante que se retome essa produção, eventualmente para fazer monocasta, mas sobretudo para dar determinadas características aos lotes”, sustenta o edil João Manuel Esteves.
Tendo a fileira do vinho “forte potencial” de inovação e investigação, “os municípios, a ESA e a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes planeiam estabelecer um conjunto de protocolos e de projetos, com o objetivo de obter dados de relevante interesse para o setor, através da colocação no território de estações meteorológicas e de sensores”, adianta o presidente do Município de Arcos de Valdevez.
Jovens e empresários com “soluções inovadoras”
Entretanto, há jovens e empresários de outros ramos a chegar ao setor dos vinhos. “Trazem soluções inovadoras, metodologias diferentes, nomeadamente na área da gestão, e outra competitividade ao Vinho Verde”, congratula-se a Associação dos Vinhos de Arcos de Valdevez.
A experiência e a excelência misturadas com a juventude são consideradas “ferramentas imprescindíveis para fortalecer a trajetória de crescimento, inovação e diversidade dos Vinhos Verdes”, de modo a transformar o ramo vinícola num dos “novos pilares do smart rural [programa estruturante de suporte ao empreendedorismo em meio rural]”, defende João Manuel Esteves.
A.F.B.