“Projeto da ‘Rede de Muita Alta Tensão’ é um erro irreversível e irreparável”

0
10

Na Assembleia Municipal (AM) de Arcos de Valdevez, a arcuense Sandrina Parga, antiga deputada municipal, insurgiu-se conta o projeto da “Rede de Muita Alta Tensão Dupla Ponte de Lima – Fonte Fria, Troço Português, a 400 kV”, no período aberto às intervenções do público.

A seguir, transcreve-se o essencial da posição assumida pela cidadã de Cabreiro naquele fórum municipal: 

“Ergo a minha voz contra um erro irreversível já cometido: a implementação do referido projeto. Quero acreditar que esta AM, assim como todos os representantes do povo arcuense aqui presentes, e a Câmara Municipal, partilham o mesmo sentimento que detenho, de profunda tristeza em relação a um projeto que só nos prejudicará em diversos setores.

Ergo a minha voz, como cidadã arcuense, movida pelo amor à minha terra […], pela defesa intransigente dos interesses da nossa região, independentemente das ideologias partidárias, […] em oposição ao erro cometido pelas autoridades competentes, nomeadamente pela ministra do Ambiente [Maria da Graça Carvalho]. Ao contrário do que foi afirmado pela governante, este projeto não é um projeto comunitário, mas sim nacional. Esta informação está claramente evidenciada no relatório da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA). Na realidade da construção de projetos da União Europeia, o setor da energia está inserido num modelo de cogestão entre a União Europeia e os Estados-Membros. 

[…] Um dos principais objetivos do Pacto Verde é a transição para a energia limpa e a independência energética, com metas concretas, como o objetivo de atingir 42% de energias renováveis até 2030. No entanto, este projeto de infraestrutura de muito alta tensão está em total desacordo com essas metas, violando os compromissos ambientais assumidos por Portugal perante a União Europeia.

O projeto que contesto […] atravessa zonas protegidas, incluindo áreas da Rede Natura 2000, […] pelo que requer uma AIA específica para essas áreas, conforme estipulado pelo Decreto-Lei n.º 140/99. Esta avaliação não consta no processo e, portanto, o projeto não cumpre as exigências legais.

Além disso, o projeto vai contra os princípios da Estratégia da Biodiversidade da União Europeia para 2030, que visa preservar áreas protegidas e restaurar os ecossistemas afetados pela intervenção humana. […] 

Em relação à agricultura, este projeto entra em conflito direto com as políticas que até agora promovem a sustentabilidade agrícola, a valorização da agricultura regional e a preservação do nosso património genético e cultural, como é o caso da raça cachena autóctone da Reserva Mundial da Biosfera. Mas a questão vai além disso. A nossa agricultura não é apenas uma atividade económica: é a nossa identidade, a nossa bandeira regional, um reflexo das nossas raízes e do nosso modo de vida. O nosso território tem sido um exemplo de resistência e inovação no setor agrícola, mantendo práticas tradicionais e sustentáveis que garantem a qualidade dos nossos produtos e a preservação dos nossos recursos naturais. Destruir esta base significa comprometer a nossa identidade e hipotecar o futuro das novas gerações.

Os impactos negativos deste projeto contrariam os objetivos da Política Agrícola Comum (PAC) da União Europeia, que promove a sustentabilidade agrícola e a proteção dos recursos naturais. Em consequência, Portugal poderá entrar em conflito com os financiamentos comunitários, o que coloca em risco subsídios essenciais para a sobrevivência dos pequenos e médios agricultores. Estaremos a comprometer não apenas a economia rural, mas a própria imagem do nosso território.

[…] Em suma, o projeto em questão é um erro irreversível […] e irreparável, que compromete os princípios ambientais, sociais e económicos que deveriam orientar o nosso futuro coletivo. 

Este é o momento de reavaliarmos a necessidade e os custos deste projeto e, mediante a fatalidade deste, devemos lutar pela proteção do que é nosso, respeitando os nossos compromissos internacionais e garantindo um desenvolvimento sustentável e responsável para todos. 

Urge, portanto, que, face a projetos desta envergadura, tomemos uma posição firme e defendamos os valores que nos tornam quem somos: uma região com um património natural único, uma cultura rica e um futuro que depende de escolhas responsáveis e sustentáveis”.