O Carnaval de Arcos de Valdevez, com um ritmo (e visual) cada vez mais galego, um “toque” de samba influenciado pelo batuque e muitos palhaços (o circo foi a principal temática deste ano), não bateu recordes, mas mesmo assim não faltou cor, alegria e diversão entre as Salzedas e a “Ponte Nova”, para júbilo de um público efusivo, sedento de folia para esquecer, por algum tempo, as desumanidades e as tropelias que afligem o mundo. A edição de 2025, como não podia deixar de ser, teve políticos parodiados e apelos à paz, com coreografias a condizer e a graciosidade que só as crianças conseguem dar.
Com o sol a abrilhantar o desfile (abençoado por chuvisco passageiro), os 1532 foliões (acima dos 1173 de 2024 e abaixo dos 1561 de 2023) entraram facilmente no espírito carnavalesco e, como de costume, um dos “pratos” fortes dos festejos pertenceu aos cinco carros alegóricos da Folia, todos concebidos pelo artista Nuno Mokuna, nomeadamente Flinstones, Luís de Camões, Palhaços, Circo e o dos “Reis do Carnaval” – este ano, foram coroados Jorge Quintas, radialista da Valdevez, e Ana Lago, Miss Alto Minho 2024 e Miss Global Universe Portugal 2024.
Para lá das alegorias, com temas e mensagens para todos os gostos, também os carros e os engenhosos adereços e fantasias dos sete comparsas da Galiza (com sonorização e locução), todos diferentes uns dos outros, ajudaram ao décor geral.
Dos grupos galegos, a maioria repetente, Ciklon (inspirado em Notre Dame), proveniente de Tomiño, com mais de uma centena de fantasiados (incluindo meninas, que mais pareciam bonecas, com carrinhos de bebé), sobressaiu quer pelas decorações quer pelos trajes e símbolos de requinte aludindo à “Magia do fundo do mar”. Também de Tomiño chegou o grupo Luces, que deu largas à criatividade com a “Realeza de luzes”, através dos acessórios e roupas da Corte Real, onde não faltaram as coroas em tamanho gigante, assim como o comparsa Estrelas da Noite, tendo como temática os “Aromas do Carnaval”.
O grupo Politicamente Incorrectos, de Couso, Gondomar (Pontevedra), apresentou-se com um divertido coletivo de disfarçados, numa bem-sucedida homenagem à “Eterna Veneza”, enquanto o agrupamento Soutelo, de O Borralliño, saiu à rua com largas dezenas de fantasiados em ambiente de “festa e alegria” como se de um arraial se tratasse. Por seu lado, o coletivo Imprescindibles, proveniente de Vigo, trouxe o vício do jogo (“Monopólio”), com um efeito visual bastante aplaudido pelo público, tal como Talismán, vindo de Pontevedra para oferecer um espetáculo de música e muita animação.
Preciosas aliadas da organização, as cerca de vinte associações/instituições arcuenses (engolidas pelas longas colunas galegas) que engrossaram o corso deram ao cortejo um colorido à sua maneira. Fora alguns temas e participações originais – a Associação Juventude Vila Fonche fez “desfilar a arte” com ‘assinatura’ de Mutes; o Grupo de Teatro do Vez (GTV) recriou “personagens” em tempos especialmente conturbados; a Associação Radiomodelismo de Arcos de Valdevez converteu a avenida numa pista para carros de modelismo; e num automóvel topo de gama podia ler-se um apelo à “baixa do preço da gasolina” –, a maioria das instituições deu ênfase ao tema do circo, assim como aos 500 anos sobre a data de nascimento de Luís de Camões (o autor da epopeia Os Lusíadas terá nascido em 1524): a este respeito, assinalaram a efeméride a Escola Básica Padre Himalaya (Távora), a Escola Básica Dr. Manuel da Costa Brandão (Sabadim) e a EPRALIMA.
A sátira política também entrou em campo com mandados de captura, por falsos agentes da Central Intelligence Agency (CIA) e do Federal Bureau of Investigation (FBI), para dois dos principais agitadores da cena política internacional, Vladimir Putin e Donald Trump. Cá dentro, a indecência da classe política, traduzida na falta de transparência e nas polémicas “avenças”, levou mesmo o GTV a perguntar se “a democracia [ainda] está viva”.
Recados à parte, muitos dos palhaços (alguns dos quais com os mais diversos disfarces) fantasiaram-se de pirata, polícia, monstro, diabo, cabeçudo, “velhinho”, macaco, freira, padre, sacristão, músico e Super-Homem. Nos grupos, a maioria dos fantasiados usou a mesma indumentária.
Os mais novos, em êxtase, foram presenças notadas no cortejo e, de vez em quando, lá iam participando nas “rábulas”, com brindes e serpentinas, ajudando com isso a encher a avenida de cor. Sem surpresa, muitos meninos foram fiéis ao Super-Homem e aos vampiros, enquanto as meninas tiveram preferência por princesas, bailarinas e sereias.
Embalado pela moldura humana que ia convergindo para a Avenida Mário Soares e o Campo do Trasladário, o vice-presidente da Folia, Rui Aguiam, disse a este jornal que a organização acompanhou desde meados de fevereiro a participação dos comparsas galegos nas suas atuações na Galiza e o corso arcuense espelhou isso mesmo.
De lembrar que o Município arcuense concedeu um apoio de 65 mil euros à associação Folia para custear a organização do Carnaval arcuense.
A.F.B.