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Feira das Artes de Soajo funde “tradição” e “modernidade”

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Arraial de cultura popular atraiu vários públicos à FAOT

Realizou-se, de 28 a 30 de julho, a 22.ª edição da Feira das Artes e Ofícios Tradicionais (FAOT) de Soajo, com perto de trinta expositores (entre artesanato, produtos do mundo rural, “tasquinhas” de gastronomia, acessórios de moda…), muitos dos quais pertença de soajeiros, e um programa que aliou a tradição e a mostra de saberes/sabores da Terra à oferta de atividades “modernas” associadas à fruição do património natural. De um lado, o espetáculo do grupo ‘Fiadeiras de Soajo’, o desfile da tradição, a malhada do milho e o folclore fizeram subir a primeiro plano a cultura de raiz popular, do outro, os trilhos de caiaque e de bike enduro, o remo em pé, as descidas do rio Adrão e a música eletrónica debitada por DJ deram um toque de “inovação” ao evento, pela mão do Soajo Outdoor Fest.

Pelo segundo ano consecutivo no pós-pandemia, o Largo do Eiró foi o epicentro da iniciativa. A mostra de artesanato e de ofícios tradicionais, primitivamente a razão de ser do certame, perdeu o fulgor de outros tempos (as demonstrações ao vivo acabaram há anos…), mas as famosas construções (espigueiros em miniatura) sobressaem sempre pela beleza e pelo primor nos pormenores. Também se viram nos stands, felizes reaproveitamentos de materiais naturais, bonitas peças de vestuário e requintadas bonecas, da artesã Gracinda Gonçalves, conhecida pela perícia com que costura indumentárias de tempos idos, segundo as várias circunstâncias (trajes de trabalho, de festa…). 

Noutra ala do recinto, este ano com mais mesas, estiveram posicionadas as “tasquinhas”, onde foram degustadas as típicas iguarias da endogenia, como os fumados e a carne cachena da serra de Soajo, sem esquecer a gastronomia caseira (rissóis, pataniscas, bolinhos de bacalhau, moelas, panados, bifanas…). Por perto, quem quis provou os vinhos da região, os licores, as compotas, o mel, os bolos caseiros ou a fruta desidratada.

Sem surpresa, o pão-de-ló, um dos maiores embaixadores de Soajo, foi um dos produtos mais comprados da feira. Nos expositores vizinhos, os produtos com o selo d’As Marias também tiveram alguma procura, inclusive “mais do que no ano transato”, comparou Lisa Araújo.

 

Terra rica em tradições

Para lá da doçaria e dos petiscos de qualidade superlativa, Soajo é terra pródiga em tradições, que, apesar de estarem a cair no esquecimento ou em desuso, ainda assim, vão sendo reconstituídas pelas associações locais de tempos a tempos. O primeiro grande momento foi protagonizado na sexta à noite com o grupo ‘Fiadeiras de Soajo’ a reproduzir o fiadeiro tal como este se fazia há décadas. Ao mesmo tempo que esguedelhavam, carpeavam e fiavam a lã, as sete mulheres fizeram ecoar no Largo do Eiró os cantares tradicionais, tendo nas costas o icónico Pelourinho, Monumento Nacional desde 1910. 

Entretanto, o programa do segundo dia reservou um desfile de trajes de Soajo. “É uma mostra do trajar dos finais do século XIX e inícios do século XX”, contextualizou Rúben Coelho, diretor do Rancho Folclórico de Vilarinho das Quartas. Pela passadeira amarela, desfilaram “modelos” com trajes de trabalho campestre (mulheres com saia de lã, blusa de chita, avental de costas e socos/chancas com meias de lã; homem com calça de lã e camisa de estofa), trajes de festa (raparigas com saia de fazenda, avental de veludo e lenço franjeiro às costas, lenço franjeiro ou lenço chinês à cabeça; rapazes com calça de fazenda, casaca de pelúcia ou casaca de fazenda e barrete) e trajes abastados para casamentos, batizados e romarias de grandes santos padroeiros (saia de fazenda, com ornamentos a veludo, fitas e vidrilhos, jaqueta de pelúcia, blusa e lenços de seda). Este “número” noturno abriu com o grupo ‘Fiadeiras de Soajo’ a cantar à capela duas cantigas e encerrou com Luís Rocha, do Couto, a fazer uma demonstração de gaita-de-foles. 

Enfim, o programa de domingo permitiu que um diversificado público (entre residentes, emigrantes, visitantes, turistas das autocaravanas…) descobrisse ou recordasse, consoante a respetiva faixa etária, os “velhinhos” carros de vacas com o desfile da tradição e a malhada do milho, labutas que dizem de onde vem o povo soajeiro. Os cinco primitivos meios de transporte que Gonçalo “Janeiro” tratou de mobilizar, carregando mato, milho, um arado, lenha e uma dorna, percorreram as labirínticas ruas (e caminhos) do centro histórico de Soajo, desde a Casa do Povo até à Eira do Penedo, passando pelo Eiró, num cortejo dominado pelos cantares da terra, pela concertina, pelos trajes e, claro, pela farta chiadeira. 

Em tempos idos, as famílias trabalhavam com estes carros de vacas e era assim que carregavam tudo. Era um trabalho duro, que pouco rendimento dava, mas era do milho que os soajeiros (e não só) “enganavam” a pobreza. Para recuperar essas memórias, foi recriada, ao som das concertinas e dos cantares de Soajo, a malhada tradicional do milho, que contou com a entusiástica participação de um grupo de escuteiros, no monumental conjunto de espigueiros tendo a serra de Soajo como “pano de fundo”. 

Ainda no domínio da essência da Terra, rica em paisagens e elementos naturais, este ano foi reforçada a ideia de oferecer um programa de atividades radicais (que terá pecado pelo “excesso” para muitos…) em simbiose com o património natural de Soajo, como a descida do rio Adrão, o trilho de bike enduro, a experiência de stand up paddle (remo em pé), o trilho de caiaque, as aulas de (acro)ioga e, noutro plano, a caminhada guiada para conhecer melhor os recantos da vila de Soajo, permitindo, de um modo ou de outro, contemplar aspetos de rara beleza e todo o conjunto edificado.

a música de raiz tradicional, legada de geração em geração, teve no festival folclórico o ponto alto do cartaz, desta feita cingido à “prata da casa”, com o Rancho das Camponesas da Vila de Soajo e o Rancho de Vilarinho das Quartas a conseguirem prender na sala de visitas de Soajo numerosa assistência, que fez questão de aplaudir esta genuína manifestação de cultura popular, que continua a atrair muitos elementos juvenis para os tablados. 

Ao mesmo tempo, na Eira Comunitária, com escasso público a presenciar, a aparelhagem operada por DJ difundia temas de música eletrónica, um curioso contraste que não terá resultado da melhor maneira, no dizer dos visitantes habituais. 

Uma coabitação cuja continuidade a organização terá de ponderar no ano que vem…

 

Três perguntas a João Manuel Esteves, presidente da Câmara e da ARDAL

“Atividades radicais em fase experimental”

  1. Porque é que os concursos – mel, broa vinho e pecuário – foram abolidos?

Provavelmente porque as pessoas que estão na organização e outros responsáveis acharam que não seria o momento certo. De qualquer modo, os produtos locais estão representados na feira e os visitantes têm oportunidade de os comprar. Quem sabe, se numa outra altura, os concursos não serão realizados como dantes!?

  1. Em que medida o aparente excesso de atividades radicais não contraria o tradicional, a razão de ser da FAOT?

As atividades radicais surgem para articular vontades… Se há atividades que são radicais para uns, não o serão para outros. Todas as iniciativas têm o seu espaço e todas são devidamente valorizadas no seu momento. Estamos numa fase experimental. Recordo que um dos grandes momentos da FAOT foi a junção de dois estilos completamente diferentes, a música da banda ‘Mão Morta’ e a do grupo ‘As Fiadeiras’, que, à partida, até podiam entrar em choque, mas, afinal, correu bem. Devemos, portanto, estar abertos a inovações, se estas não resultarem em pleno, será uma aprendizagem para o futuro.

  1. Por que razão alguns artesãos e produtores não conseguiram participar na FAOT deste ano?

Os expositores costumam vir e, por regra, não têm dificuldade em cá estar. Por aquilo que estou informado, houve pessoas, este ano, que se inscreveram tarde ou não tiveram o espaço que pretendiam, mas isso é uma circunstância que se resolve. Estamos sempre recetivos a melhorar. 

A.F.B.

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