O grande evento comemorativo dos 500 anos do nascimento de Luís Vaz de Camões coincidiu com a realização da Semana Concelhia da Leitura, da Ciência e das Artes, entre 31 de março e 4 de abril, nas várias unidades do Agrupamento de Escolas de Valdevez (AEV), na EPRALIMA e na Casa das Artes. Durante estes cinco dias, os diferentes espaços dinamizaram atividades com o intuito de homenagear um dos grandes baluartes das letras portuguesas – Camões é considerado, por grande parte da crítica especializada, o maior poeta português de todos os tempos.
Do diversificado programa resultou uma troca intergeracional de conhecimento e uma rara interação entre diferentes públicos, permitindo entrecruzar momentos de poesia, teatro, música, exposições, desenho, palestras, oficinas… Enfim, da poesia à ciência, do desenho à pintura, do teatro à robótica, das páginas dos livros ao palco da Casa das Artes, das experiências laboratoriais às novas tecnologias, cada espaço afirmou-se como um cenário de descoberta.
Dirigindo-se a uma plateia de alunos do 1.º ciclo da Escola Básica Prof. António Melo Machado, o escritor e ilustrador Nuno Caravela disse “não haver limites para a imaginação”, como é disso exemplo a coleção “O Bando das Cavernas”, que inclui o livro Camões – Poeta e Herói. “O próprio Camões teve de recorrer à imaginação para escrever a sua grande obra épica, Os Lusíadas. É pela imaginação (e pela diversão) que temos de trazer as novas gerações para a leitura. É importante que as crianças sintam que ler pode ser algo divertido, além de ser um exercício pedagógico”, começou por afirmar o autor de Lisboa.
Nesta “viagem pela imaginação”, Camões é o “herói pela sua vida aventureira, só um herói é que conseguia superar aquelas aventuras todas, e, acima de tudo, é o grande poeta português. Para uma primeira abordagem, entendo que se deve explorar Camões através da nova linguagem dos meninos e o livro Camões – Poeta e Herói responde a esse desafio com uma escrita moderna”, reforçou ao NA Nuno Caravela.
“Jogo interativo” para compreender obra camoniana de forma lúdica
Por seu lado, Ulisses Mota, antigo docente no AEV, socorreu-se das ferramentas digitais e dos “jogos de fuga” para captar a atenção de um grupo de alunos do 9.º ano em relação à obra camoniana. “Eu uso muito o registo digital para motivar os alunos, mostrando-lhes que podemos trabalhar a literatura através dos meios digitais, que, por si só, não são a resolução de problemas. O objetivo primeiro é aprender, de preferência de forma lúdica”, avultou o professor de Braga.
Na oficina “Camões – 500 anos de letras e números (Jogo de Fuga)”, Ulisses Mota provou que o grande autor do século XVI “conseguiu aliar a matemática (números) ao português (letras) e, por incrível que pareça n’Os Lusíadas, estas duas áreas têm muito de comum, desde logo porque as estrofes e a métrica assentam em números”. E, no “novo reino dos números”, justamente na Sala do Futuro, os alunos muniram-se de computador e de telemóvel para resolver enigmas, fazer cálculos precisos, decifrar códigos e descobrir conjuntos-solução de equações de primeiro e segundo grau, através da leitura proficiente das perguntas/instruções.
Na prática, a atividade “500 anos de Luís de Camões: Navegando entre as letras e os números” revelou-se “um jogo de fuga educativo digital inovador” que integrou as disciplinas de Matemática e de Português. Tendo como o alvo os alunos do 3.º ciclo, “o jogo celebrou o legado de Luís de Camões, transportando os jogadores/alunos para uma aventura interativa repleta de desafios, envolvendo a literatura e a matemática”.
Através da “bússola” da palavra, os jogadores exploraram os mistérios e os encantos de Os Lusíadas, “desvendando metáforas, descobrindo heróis e enfrentando criaturas míticas”, como o Adamastor. Durante a “viagem”, os alunos “mergulharam nas profundezas dos versos camonianos, navegando entre estrofes que contam feitos gloriosos e amores eternos”.
Numa semana repleta de encontros e reencontros com autores, investigadores, palavras, imagens, sons e conhecimento, também a arte visual e o teatro subiram a primeiro plano, como a seguir se verá.
Camões retratado como combatente (soldado) e patriota
De caráter boémio e temperamental, Camões envolveu-se em altercações e, por várias vezes, foi preso. Para escapar às perseguições, resolve embarcar, como soldado (manejava com perícia a espada), para África, servindo dois anos em Ceuta. Lutou contra os mouros e durante uma peleja perdeu o olho direito, em combate pela praça de Ceuta, e, por isso, passou a usar uma pala no olho.
Muito viajado, o grande poeta também viveu na Índia e Macau (Ásia). Num dos seus regressos de Macau e Goa, Camões foi vítima de um naufrágio, onde terá salvado o manuscrito de Os Lusíadas, nadando com um só braço para poder manter, com o outro, a grande obra épica.
A partir destes pressupostos, os alunos do 9.º ano, com a ajuda dos professores Luís Troufa e Fernando Cerqueira, deram asas à imaginação e, desenharam, à sua maneira, “uma pala personalizada (patriótica, tecnológica, moderna, artística ou de exploração espacial) de Camões, refletindo uma ideia ou traço de personalidade”. No fundo, tratou-se de uma “ode visual aos 500 anos de Camões”, misturando “história, imaginação, arte e estilo pessoal”.
Teatro com inspiração
O Clube de Teatro do AEV, dirigido pelo professor e encenador José Barros, dramatizou, no auditório da Casa das Artes, a peça de teatro Camoens, projeto inserido no âmbito das comemorações dos 500 anos do nascimento do grande autor. Com brilhantismo, o elenco apresentou os “amores de Camões até ao momento da sua partida para o Oriente no Ano da Graça de 1553”.
Ponto alto da peça o momento em que Luís de Camões foi preso – em 1553 – no Tronco por ter ferido Gonçalo Borges, empregado do paço. Mas graças ao indulto do rei D. João III, Camões partiu nesse mesmo ano para as Índias perante os acenos da turba que se despediu do grande herói português.
Nos papéis de Luís de Camões (Guilherme Gomes), Leonor (Marilene Codeço), Francisca de Aragão (Lara Barbosa), Catarina de Ataíde (Paloma do Nascimento), Gonçalo Borges (Henrique Quintas), Ana de Sá (Teresa Fernandes) e Violante de Andrade (Arianna Pereira), o elenco ofereceu um espetáculo de inegável qualidade, onde sobressaíram a expressividade e a projeção vocal, o ritmo e a versatilidade, a inspiração e o talento dos jovens atores.
Como a organização já anunciava, na Semana Concelhia da Leitura, da Ciência e das Artes, “o público escolar foi poeta, cientista, artista, ator e navegador do saber, cruzando oceanos de ideias rumo ao futuro, inspirado pelo engenho e pela arte do nosso autor épico maior”.
A.F.B.