Na Assembleia Municipal (AM) de 29 de setembro, realizada no salão polivalente da associação ADECAS (Aboim das Choças), o CDS trouxe novamente à baila o projeto da Linha de Muito Alta Tensão (LMAT), o qual mereceu, em momentos distintos, moções de rejeição, a uma só voz, por parte de todas as forças políticas representadas nos fóruns municipais, insuficientes, no entanto, para que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) pusesse um travão à infraestrutura.
“Apesar de os órgãos eleitos deste concelho terem manifestado o seu repúdio à construção da LMAT, que nitidamente vai prejudicar as populações aqui residentes, sem qualquer mais-valia e depois de toda a argumentação apresentada para inviabilizar tal pretensão, verificámos que a APA aprovou […] o Relatório de Conformidade Ambiental (RECAPE) apresentado pela empresa promotora. É caso para perguntar ao presidente da Câmara, depois de toda a discussão e depois de todo o envolvimento das populações contra esta obra, o que é que se vai seguir. Não podemos assistir impávidos e serenos a esta monstruosidade que vai afetar a saúde das populações e colocar em risco o futuro deste concelho. O senhor presidente foi eleito pelos arcuenses e tem de defender junto das instâncias do Governo a inviabilidade desta obra. Será uma mancha que ficará no seu consulado, caso se concretize”, acusou o deputado Fernando Fonseca.
Em resposta, o presidente da Câmara reafirmou a “oposição do executivo municipal ao avanço da LMAT, mas, infelizmente, a APA deu pareceu favorável, o que é muito mau para as nossas pretensões. Seja como for, as várias câmaras, cujos territórios poderão vir a ser atravessados pela infraestrutura, articularam um processo contra a decisão da APA, resta-nos aguardar por um desfecho positivo”, adiantou João Manuel Esteves, negando “qualquer mancha futura no mandato, porque a decisão de inviabilizar a obra não é minha, e eu tenho feito tudo para que a LMAT não avance no traçado definido”, escudou-se o autarca social-democrata.
Segundo o apurado por este jornal, as câmaras de Arcos de Valdevez, Ponte da Barca, Ponte de Lima, Monção e Melgaço moveram, em tempos, uma providência cautelar contra o Estado com o objetivo de inviabilizar o projeto, mas, até prova em contrário, não obtiveram qualquer resultado prático.
Apesar das questiúnculas técnico-jurídicas, e dada a quase certa prossecução do projeto, o edil arcuense defende alterações ao traçado ou, em alternativa, a adoção de medidas para aliviar os efeitos da travessia. “O ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, tem em seu poder uma proposta dos autarcas da região no sentido de considerar o mesmo corredor onde vai passar o comboio de alta velocidade, essa possibilidade iria potenciar a sua utilização. Caso contrário, é preciso encontrar medidas para mitigar os vários impactos (de ordem ambiental, social e económica). Além do mais, a travessia desta LMAT só é importante se a Península Ibérica conseguir passar uma linha nos Pirenéus, sob pena de a construção não ter o efeito esperado, que é o de entrar no mercado europeu de energia, sendo esta aspiração uma incumbência dos Estados ibéricos ao mais alto nível”, salvaguardou João Manuel Esteves.
Lugares de passagem da LMAT
A construção da infraestrutura desrespeita a vontade dos representantes dos munícipes, para lá do facto de Arcos de Valdevez fazer parte da Reserva Mundial da Biosfera. Mas esta polémica não é de agora. Em 2014 e 2020, a AM de Arcos de Valdevez já tinha emitido moções desfavoráveis à travessia no território da LMAT, posição reafirmada já este ano, logo que se soube que a solução escolhida ia causar “fortes impactos negativos”, visto o projeto atravessar parte da freguesia de Sistelo, que é classificada de Monumento Nacional. Além de Sistelo, o traçado da LMAT prevê a sua passagem em S. Jorge, Vale, Ázere, Couto, Gondoriz, Vilela, São Cosme e São Damião, Sá, Cabreiro, Álvora e Loureda.
Esta é uma obra que vai requerer a “construção de torres de betão”, em “lugares de difícil acesso”, exigindo a “abertura de caminhos”, trabalhos que “ameaçam a biodiversidade e o equilíbrio ambiental existente nos locais atravessados”, avisam os opositores ao projeto.
Campos magnéticos “prejudiciais à saúde das populações”
A instalação da LMAT irá originar a formação de campos magnéticos, “prejudiciais à saúde das populações” e “lesivas do estado de conservação das espécies (flora e fauna)”. Ainda de acordo com os peritos, a LMAT é uma estrutura que tem associada, ao seu funcionamento, uma “série de impactos negativos que ameaçam seriamente a qualidade de vida das populações residentes nas suas imediações”, nomeadamente pela “exposição permanente ao ruído e às radiações eletromagnéticas”, a par do “grande impacto visual” que provocam.
Para os críticos da construção, ambientalistas incluídos, “há também o sério risco de prejudicar para sempre o património ambiental, paisagístico e cultural em zonas de proteção como Rede Natura 2000, Áreas de Reserva Ecológica Nacional, Áreas de Reserva Agrícola Nacional, Paisagem Cultural de Sistelo, colocando em causa a sustentabilidade económica de vários setores económicos, como o turismo de natureza e o ramo agroalimentar”.
A.F.B.