São três manchas ou plantações de vinha que embelezam a paisagem na freguesia de Grade. Da Casa do Passal, dos Três Herdeiros e do Chão da Portela, é de onde saem os vinhos “Muros de Grade”, misturando “a cultura local, a biosfera e o carinho” que a família Brandão sempre consagrou à freguesia. Depois do período experimental, em que o “investimento foi mais reduzido”, a implementação deste projeto, produtor e engarrafador de vinho verde, exigiu um “forte investimento em equipamentos e infraestruturas”. Referência recente no mercado dos vinhos de pequena tiragem, a marca arcuense aposta numa trajetória de “crescimento sustentável”. Mais que uma atitude ou prática estética, a vinicultura é um compromisso com a comunidade.
“As primeiras plantações foram efetuadas em 2015, cerca de 3,5 hectares (ha) de vinha. Em 2020 e 2022, realizámos novas plantações e, neste momento, possuímos cerca de 8 ha de vinha onde a casta predominante é o Loureiro”, começa por dizer Filipe Brandão. A primeira plantação coincidiu, justamente, com a fundação do projeto Agrosfera, em 2015. “O nosso objetivo foi (é) o de rentabilizar as propriedades rurais e, desse modo, dar o nosso contributo na luta contra a desertificação da freguesia de Grade”, sublinha o empreendedor.
Apesar dos “resultados serem encorajadores” e “corresponderem às expetativas”, Filipe Brandão tem os pés bem assentes na terra. “Temos a noção, desde o início, de que este é um projeto a medio/longo prazo. O desafio que se coloca passa por encontrar formas de capitalizar os recursos naturais do nosso meio e conseguirmos implementar uma agricultura geradora de rendimento, ao invés de uma agricultura de subsistência, filosofia que, sob a perspetiva das memórias, não impede um regresso às origens, em que cada palmo de terra era trabalhado e eram raras as propriedades abandonadas”, lembra o produtor.
Mas, quando se fala em “tradição ou preservação de memórias”, o objetivo “não é voltar ao passado”, o que move o projeto Agrosfera é o “respeito pela terra e pelo meio onde estamos inseridos”, a preocupação em “não deixar morrer o conhecimento ancestral”, sempre aliado à “modernização dos meios de produção, de forma a criarmos um projeto sustentável, ligado ao desenvolvimento da nossa comunidade”.
É sob este ângulo que Filipe Brandão coloca o acento tónico na “recuperação” e no “aproveitamento” de “recursos naturais abandonados, exemplo das águas de rega”, sem descurar, obviamente, uma “forte aposta na mecanização e na mão-de-obra especializada”, pois, sem estas premissas, nunca um microprodutor conseguirá implementar um projeto sustentável”, observa Filipe Brandão.
“Os vinhos ‘Muros de Grade’ refletem o terroir”
Sob a marca “Muros de Grade”, os vinhos parecem ser muito o resultado da paixão dos seus promotores pela terra e pelos lugares da freguesia, na medida em que o vinho reflete o terroir (clima, elevação do terreno, exposição solar, solo, subsolo e drenagem de água) em que está implantado, ao mesmo tempo que espelha percursos de vida. “É uma combinação dos dois parâmetros, existe tradição familiar – a cultura da videira e a produção de vinho sempre fizeram parte do ADN da nossa gente – e, depois, há a parte dos trajetos de vida: a nossa aposta em plantarmos vinha em solo granítico e a 400m de altitude é um reflexo desse trajeto onde rompemos com a tradição”, conta Filipe Brandão.
“Cada vinha tem o seu terroir e todo o vinho espelha esse terroir. Temos vinhas espalhadas pela freguesia a diferentes altitudes e em solos com características diversas, neste sentido, podemos dizer que os nossos vinhos refletem o terroir da freguesia de Grade”, reforça o promotor.
O primeiro vinho, Loureiro, a ser comercializado remonta a 2018, enquanto o Rosé e a Reserva foram lançados em 2020. Mesmo preferindo que sejam os clientes a descrever os néctares que saem das encostas da freguesia, Filipe Brandão salienta o “baixo teor de gás carbónico dos vinhos ‘Muros de Grade’, uma aposta com resposta positiva do mercado. Uma outra característica marcante prende-se com a aptidão dos nossos Loureiros para o envelhecimento”, regozija-se Filipe.
As primeiras grandes distinções vieram logo em 2023. “Foi com agrado que as recebemos, é sempre gratificante vermos o nosso esforço ser reconhecido. É um fator de motivação, mas também de responsabilidade para toda a equipa envolvida neste projeto”, ressalva o investidor.
Atual e futura capacidade de produção
A capacidade de produção é, neste momento, de “25 toneladas de uva, este ano, vamos produzir cerca de 20 mil garrafas. O nosso objetivo, a curto prazo, é termos uma capacidade de produção de cerca de 50 toneladas de uva”, estima Filipe Brandão.
O projeto “emprega diretamente dois funcionários a tempo inteiro” e “subcontrata quadros especializados em Enologia e Engenharia Agrónoma”, técnicos que nos “fornecem apoio no cultivo das vinhas e na produção do vinho”. Além disso, há a registar o recurso a “mão-de-obra sazonal” e o “forte apoio de toda a família, nomeadamente dos pais, sem os quais este projeto não teria sido possível”, admite o produtor.
Importância das parcerias para ganhar escala
Radicado nos Estados Unidos há vários anos, Filipe Brandão entrevê futuro nos Arcos, sobretudo nas atividades ligadas à agropecuária e à floresta. “Tendo em conta a realidade geográfica do nosso concelho, a cultura da vinha, a pastorícia e a floresta são as áreas em que devíamos apostar. Aliás, através do meu avô paterno, o meu envolvimento no setor primário foi uma realidade desde criança. Esse passado, conciliado com os objetivos definidos na criação da Agrosfera e com a realidade geográfica da freguesia, fez com que a atividade vitivinícola fosse a mais compatível para o avanço da iniciativa”.
O projeto está a consolidar-se, “mas ainda estamos no início e, portanto, longe de nos sentirmos realizados. Neste tipo de projetos, sabemos como se começa e não como se acaba, mas a nossa intenção no futuro passa sempre por sermos microprodutores. Economias de escala no concelho de Arcos de Valdevez, pela sua realidade geográfica, são de difícil implementação, acredito que o futuro da agricultura nos nossos núcleos rurais passe pela microprodução, só através de sinergias, é possível conseguir alguma escala”, conclui Filipe Brandão.
A.F.B.