Arcos de Valdevez é o terceiro concelho do distrito de Viana do Castelo com mais fogos por ano em média (215) e, mais grave ainda, é o município da região com maior área ardida (1698 hectares em média por ano), sensivelmente 21,5% dos 7905 hectares de floresta consumida anualmente, entre 2001 e 2023, segundo os dados fornecidos ao NA pela Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF). No período em referência, só os concelhos de Ponte de Lima (246 ignições em média por ano) e Viana do Castelo (226) tiveram uma maior incidência de fogos do que Arcos de Valdevez.
No contexto distrital, os anos com maior área ardida foram os de 2005, 2010 e 2016, enquanto o mês de agosto é, por regra, o que regista um maior número de ocorrências e também de área queimada. De acordo com o relatório da AGIF, citando os dados estatísticos do Sistema de Gestão Integrada de Fogos (SGIF), “a área ardida causada por incêndios com ponto de ignição no Alto Minho é muito variável, em média arderam os referidos 7905 hectares por ano, no período de 2001 a 2023. Ardeu relativamente pouco nos anos pós-2017, mas não quer dizer que o risco de anos severos com grandes incêndios tenha sido afastado”, observa a Agência no estudo “Causalidade e outros indicadores dos incêndios no Alto Minho”.
Mas em anos recentes tem-se verificado um “pico” secundário em meses de inverno, mostrando que o paradigma está a mudar. “Os incêndios florestais na nossa região, infelizmente, não têm época, a sua sazonalidade é quase diária em todas as estações do ano”, frisa o comandante dos Bombeiros Voluntários de Arcos de Valdevez (BVAV), Filipe Guimarães, querendo dizer que “os incêndios não têm estação, acontecem todo o ano”.
No mapa regional, o concelho arcuense tem “muitas particularidades”, alerta o comandante Sub-regional de Emergência e Proteção Civil do Alto Minho. “Arcos de Valdevez é, simplesmente, o território do distrito de Viana de Castelo mais achatado no que diz respeito ao número de incêndios rurais, justamente aqueles que são mais visíveis e que criam mais impacto, colocando, em primeira instância, as comunidades em maior risco. São incêndios de serra que arrancam com muita velocidade, […] daí a importância de o ataque inicial ser feito prontamente por meios aéreos, atendendo ao tempo que os meios terrestres demoram a chegar às ocorrências devido à orografia acidentada e à distância que é necessário percorrer”, explica Marco Domingues.
Por curiosidade, no Alto Minho, o concelho com menor número de ocorrências por ano, entre 2001 e 2023, foi o de Vila Nova de Cerveira (41) e o município com menor área ardida foi o de Valença (460 hectares por ano).
Queimadas na origem de 48% dos incêndios nos Arcos entre 2001 e 2023
Segundo os registos do SGIF, a grande maioria dos incêndios ocorridos entre 2001 e 2023 teve origem humana (descuido ou premeditação), enquanto as causas naturais identificadas oficialmente são muito residuais. Por fim, para uma parte das ignições, não foi possível apurar uma causa objetiva.
No período em análise, no concelho de Arcos de Valdevez, a principal causa dos incêndios residiu, justamente, nas queimadas, associadas maioritariamente à renovação de pastagens, representando 48% do total das ignições. Segue-se como segunda causa apurada o incendiarismo, responsável por 36% dos fogos ocorridos no concelho arcuense. Os reacendimentos correspondem a 13% das ignições verificadas no território de Arcos de Valdevez.
Fogo posto principal causa das deflagrações neste concelho desde 2018
Os grandes incêndios que deflagraram em outubro de 2017, em Pedrógão Grande e Góis, marcam um ‘antes e depois’ na abordagem que passou a ser feita à problemática.
Para os incêndios ocorridos entre 2018 e 2023, verificaram-se “percentagens menores de queimadas e maior contribuição do incendiarismo e dos reacendimentos”. Apesar disso, “uma parte significativa das queimadas é feita em dias de elevado perigo, reforçando a necessidade de continuar as ações de sensibilização e acompanhamento dos pastores e outros utilizadores do fogo para queimarem em segurança e com baixo risco de perda de controlo”, defendem os peritos.
Entre 2018 e 2023, as principais causas identificadas como estando na origem dos incêndios no concelho de Arcos de Valdevez foram o incendiarismo (53% das ocorrências), queimadas (26%) e reacendimentos (17%).
Para o AGIF, “os incêndios em dias de elevado perigo meteorológico ardem com elevada intensidade, são difíceis de controlar e têm impactos desproporcionados”. São estes incêndios que “o Plano Nacional de Ação quer evitar ao máximo. O objetivo é uma redução de 50% até 2030”, baliza a Agência.
Jovem ateou nove fogos em São Jorge e Ermelo
O caso mais mediático de incendiarismo no concelho arcuense foi conhecido em 2022. Um jovem estudante, à época com 17 anos, ateou nove fogos florestais, alegadamente por “diversão”, entre 12 de fevereiro e 4 de abril de 2022, na União de São Jorge e Ermelo. Estes incêndios “consumiram vegetação herbácea, mato e arvoredo, principalmente pinheiros, só não atingindo maiores proporções devido à rápida e eficaz intervenção dos BVAV”, explicou na altura a Polícia Judiciária (PJ).
Por decisão do juiz de instrução criminal de Viana do Castelo, o jovem detido pela PJ de Braga foi colocado em prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo (em Matosinhos), onde recebeu tratamento psiquiátrico, antes de prestar trabalho comunitário.
A detenção do jovem resultou do alerta do Grupo de Trabalho para a Redução de Ignições em Espaço Rural, dado que os vários locais onde os incêndios ocorreram se localizavam numa zona onde, segundo a PJ de Braga, “existiam condições de propagação a manchas florestais de grandes dimensões, gerando enorme risco” e “perigo concreto para as pessoas, para os seus bens patrimoniais e para o ambiente”.
As freguesias de São Jorge e Ermelo, onde ocorreram os incêndios, têm sido, “recorrentemente e há vários anos a esta parte, alvo de ignições com natureza dolosa que têm resultado em grandes áreas ardidas”, conclui a PJ.
A.F.B.