Os partidos da oposição com assento na Assembleia Municipal realçaram que o concelho de Arcos de Valdevez é, de forma recorrente, “um dos territórios com maior número de ignições (e com maior área ardida) a nível distrital e nacional”.
Com “as mudanças do clima”, “o abandono do mundo rural” e “a degradação dos ecossistemas”, os incêndios “têm-se revelado cada vez mais rápidos e complicados de gerir”, muito embora a maioria das deflagrações seja sanada nos primeiros 90 minutos.
Ao clima e à densa massa combustível junta-se “a inexistência de políticas de ordenamento”, bem como “o avanço das espécies invasoras”, sem esquecer “a orografia com declives acentuados e zonas montanhosas”, que dificultam a intervenção, quer no combate, quer nos trabalhos de prevenção.
Outra dimensão é a “falta de cultura de proteção civil” com a suspeita de “incendiarismo” a pairar em muitas das ignições.
“Urge proteger a floresta”
Emília Vasconcelos, da CDU, esmiuçou o “falhanço” da estratégia de proteger a floresta. “Os relatórios e leis criados em abundância não foram eficazes, pois não valorizaram o preço da madeira, não criaram novas equipas de sapadores, não dinamizaram o ordenamento do território, não apostaram em espécies autóctones, não ajudaram à elaboração do cadastro florestal e não contribuíram para a distribuição equilibrada das ajudas públicas a favor das regiões onde a floresta e a agropecuária têm mais presença”. Sob este ângulo, “é urgente outra política agrícola, outra política florestal e a definição da defesa da floresta portuguesa como prioridade da ação política”, apontou a deputada do Vale.
Do conjunto de medidas a adotar com vista a um “justo regime de financiamento” das associações humanitárias, brigadas de sapadores e restantes forças de Proteção Civil, conta-se “a criação de um modelo de bonificação permanente dos combustíveis utilizados no exercício da missão de prevenção e combate aos incêndios, vulgarmente designado por ‘gasóleo verde’, a ser utilizado nas máquinas e veículos destinados às ações de limpeza e defesa da floresta contra incêndios”.
Para Emília Vasconcelos, “defender a floresta é defender as populações e o concelho arcuense, é criar condições para que o drama a que assistimos não se repita com as dimensões a que temos assistido”. Mas este caminho “exige opções de fundo e meios para isso”, que passam por “apoiar o desenvolvimento da pequena e média agricultura, e, em simultâneo, garantir, no mundo rural, os serviços públicos e o emprego de qualidade para fixar as populações no território”; “ajudar os proprietários e entidades gestoras no acesso a apoios para a gestão dos combustíveis”; “apostar no plantio de folhosas para travar o caminho da eucaliptização”; “apoiar as Zonas de Intervenção Florestal”; e “garantir aos bombeiros os meios para que cumpram a sua missão com eficácia”.
“Temos de usar o fogo bom”
Contra “mais uma deriva legislativa inútil”, como a que sucedeu após os grandes incêndios de 2017, o deputado Vítor Sousa, do PS, considerou que, “de pouco ou nada, irá servir a discussão sobre o incendiarismo para diminuir o número de incêndios rurais no nosso concelho. Ignições teremos sempre. Não há volta a dar”, atalhou o porta-voz do maior partido da oposição.
E “o cenário não tenderá a melhorar – as pessoas que ainda praticam alguma agricultura de subsistência, e que ainda vão mantendo a paisagem, são pessoas idosas que, nas próximas duas décadas, irão deixar essa atividade, aumentando, assim, as áreas agrícolas ao abandono. Este é o resultado de uma política de desinvestimento que teve um acontecimento que marcou a paisagem do mundo rural – o fim dos postos de recolha de leite nas freguesias, tendo começado aí o abandono dos montes e das terras”, balizou.
Para reduzir o risco de repetição de incêndios “descontrolados”, Vítor Sousa enumerou oito medidas, “facilmente executáveis à escala municipal”, a saber: “plano municipal de fogo controlado, implementado anualmente, criando mosaicos de gestão de combustível – no fundo, usar o fogo bom para prevenir o fogo mau”; “beneficiação de pastagens nos pontos críticos, promovendo e fomentando o pastoreio, de forma a diminuir os combustíveis nas áreas sinalizadas”; “promoção de políticas de apoio ao consumo de produtos locais, à gestão partilhada e à comercialização dos produtos”, mediante “ajudas diretas e indiretas ao produtor”; “implementação do Programa de Aldeia Segura, Pessoas Seguras”; “gestão das faixas de combustível”; “criação, à escala municipal e sob a égide do serviço de Proteção Civil, de equipas que, recebendo formação, meios e preparação adequados, possam fazer trabalhos de gestão florestal”; “emparcelamento funcional, criando parcelas de maior escala para as tornar mais rentáveis”; e “implementação de uma estratégia de consciencialização da população em geral”.
“Abandono das terras”
Depois de notar a falência das políticas de combate – “desde a descoordenação da cadeia de comando até à inexistência de equipamento apropriado, por falta de apoio das entidades competentes”, o CDS defendeu a “aposta na prevenção”, considerando os desafios que se colocam ao território de Arcos de Valdevez.
“Com uma população envelhecida e zonas extensas de território abandonado, o nosso concelho sofre as consequências de falta de políticas que sucessivamente têm sido adiadas e, consequentemente, temos o abandono das terras e falta de limpeza das matas”, sublinhou Fernando Fonseca.
Neste âmbito, “a utilização das terras agrícolas e a limpeza das matas terão de ser feitas com as populações locais, mas isto só é possível com a criação de condições que permitam a fixação de população jovem. As associações florestais também têm um papel importante para a manutenção da floresta. Há equipamentos como os drones que poderiam dar um importante avanço na prevenção e deteção de ignições. Temos também de considerar a questão dos fogos provocados intencionalmente, mas isso já é um outro aspeto que compete ao Estado acautelar”.
Por outro lado, “o BUPI (georreferenciação das terras e a sua titularidade) é uma ferramenta disponível para o levantamento cadastral e, através de planos florestais, será possível definir um ordenamento de plantio de espécies permitindo às populações terem um rendimento sustentável”.
Na ótica de Fernando Fonseca, uma outra intervenção imediata consiste na “criação de ajudas para quem apresente planos de florestação das suas parcelas, com espécies arborícolas adaptadas ao meio onde se inserem, mediante a atribuição de medidas compensatórias, dado que as espécies autóctones não são tão apetecíveis do ponto de vista de mercado”.
Para o CDS, “as autarquias têm uma palavra importante sobre a questão dos incêndios, pois encontrando-se elas mais próximas das populações, estão mais esclarecidas acerca das medidas a tomar”, concluiu Fernando Fonseca.
“Há caminho para percorrer”
Dando crédito às palavras dos “especialistas” Vítor Sousa e Fernando Fonseca, o deputado José Lago Gonçalves, do PSD, admitiu “haver ainda muito caminho a percorrer. Neste sentido, registamos que o Plano Municipal de Emergência é uma prioridade, nele verificamos que há os momentos de ação, que fazem parte da solução, e aos quais devemos estar particularmente atentos, mas outra parte importante residirá na prevenção, na construção e melhoria das infraestruturas, na limpeza e no restauro das áreas florestais. Neste trabalho, cabem ainda a sensibilização dos proprietários, a adoção de medidas que reforcem a coesão territorial e o crescimento equitativo nos territórios de baixa densidade populacional, porque o desfasamento entre o litoral e o interior não é um tema de agora, e esse é um fogo que arde sem se ver”, atirou o porta-voz da bancada social-democrata.
Apesar disso, a maioria PSD elogiou “o esforço contínuo da Câmara na aposta das parcerias entre os vários agentes da Proteção Civil, algo muito importante para a melhoria da qualidade de vida, assim como para a segurança do território e da proteção de pessoas e bens”. O jovem tribuno felicitou, de igual modo, o Município por ter “reforçado a atividade corrente dos Bombeiros de Arcos de Valdevez, que contam atualmente com três equipas de intervenção permanente, além de apoiar quatro equipas de sapadores florestais. Em paralelo, foram entregues equipamentos de proteção individual e veículos”.
Supletivamente, “a nível das infraestruturas”, têm sido executados “trabalhos de melhoramento das instalações, como é o caso do Centro de Meios Aéreos (CMA), com a inauguração do hangar e das pistas de aterragem e estacionamento. Este CMA foi ampliado e hoje tem capacidade para três pontos de estacionamento para helicópteros, utlizados no âmbito do combate a incêndios rurais e de emergência médica, uma mais-valia incalculável para o nosso Município”, regozijou-se José Lago Gonçalves.
A.F.B.