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Festejou centenário em plena condição física e mental

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No passado dia 9 de março, completou cem anos de vida Manuel Esteves Padroso, na companhia de alguns sobrinhos, na freguesia de Rio de Moinhos. Apesar da idade avançada, Manuel Esteves Padroso leva uma vida autónoma, vivendo em perfeitas condições de locomoção e tendo uma memória fresca.

Com uma vida plena – serviu 37 anos na Armada –, Manuel Esteves Padroso descobriu tarde a veia da escrita, tendo-se estreado, em 2020, com as Memórias de um Marinheiro, em prosa, seguindo-se Ensaios de Poesia (2021). No ano findo, lançou o livro O Segredo da Longevidade.

Para o autor, assinante do NA, a pandemia foi uma oportunidade para soltar o dom da escrita, sobretudo o “gosto pela poesia” que desabrochou muito cedo. “Na minha juventude escrevia cartas em verso às namoradas”, conta Manuel Esteves Padroso, natural de Rio de Moinhos, mas a residir a maior parte do tempo em Lisboa. 

O livro Ensaios de Poesia, pequena compilação de 14 composições poéticas, de estrutura e conteúdo diversificados, desenvolve-se à volta de factos mundanos passados na sua existência e de experiências que o poeta vivenciou na primeira pessoa, com especial realce para as tradições, os usos e costumes dos ambientes campestres (“O Cultivo do Linho”, “As Quatro Estações no Minho” e “A Minha Terra Natal”).

Por seu lado, o volume Memórias de um Marinheiro “relata os principais episódios da vida de criança” em que o protagonista passou por várias privações, pretendendo-se “alertar a juventude mais favorecida que atualmente tem acesso à instrução”. 

Já na pequena obra O Segredo da Longevidade o autor desvenda algumas regras de ouro para manter o aspeto jovem com tão proveta idade: estilo de vida saudável, modo como se é educado, alimentação regrada, trabalho temperado com descanso, exercício físico regular…

Filho de Manuel Rodrigues Padroso, antigo correspondente do NA em Rio de Moinhos, o centenário fala da família com orgulho apesar da distância física. “Tenho 31 sobrinhos, emigrantes na sua maioria. Os verões são, por isso, um tempo de reencontros. Eles vêm do estrangeiro e eu de Lisboa para matarmos saudades uns dos outros”, conta Manuel Esteves Padroso. 

 

Testemunho na primeira pessoa

Cem anos de apelo à Justiça 

Submisso à implacável lei da Natureza, pela qual o nascimento é uma transformação da matéria*, cumpre-me considerar que a morte será a continuação do cumprimento dos mesmos desígnios naturais.

Durante um século a “transformação” impôs as formas que moldaram o meu ser, o meu carácter, as minhas acções, a minha dimensão – partícula incomensurável perante o Universo que me detém. Reduzido a tal insignificância, suportei os caprichos impostos pela força que o Mundo aglomera, praticados através de seres semelhantes, porém mais beneficiados, divergindo os efeitos que comandam a vida.

Tais circunstâncias condicionaram a minha evolução num meio de carências, privando-me de assimilar os benefícios que a civilização franqueia a todas as crianças. “Arrastando” as adversidades, evoluí com severidade e consegui obter uma profissão que me deu independência, com a qual, além de garantir a subsistência, permitia assistir os mais necessitados: diariamente e, muitas vezes de noite, eu estava disponível, defrontando situações de pobreza que me impediam de cobrar as devidas remunerações. 

Tinha em mente uma frase proferida pelo 1.º vice-rei da Índia Portuguesa, D. Francisco de Almeida: “Vim para servir e não para enriquecer”, que usei numa redação que compunha as provas de admissão ao curso de Enfermagem Naval.

Servi 37 anos na Armada, 17 dos quais andei embarcado, como responsável pelo Serviço de Saúde a bordo, tendo participado em exercícios da NATO, em que fui classificado como “Extraordinário”, mas o louvor foi para o comandante do navio. Contudo, na Guerra do Ultramar cumpri uma missão de três anos e fui louvado pelo diretor da Rádio Naval de Luanda (Angola).

Mais uma conjunção adversativa e eis-me a bordo duma fragata onde me estava reservado o serviço de cantineiro, em acumulação com a prática profissional, com evidente incompatibilidade. Além de subtrair o tempo destinado ao exercício da Saúde Naval, estava inerente a promoção da venda de tabaco e bebidas alcoólicas. A minha recusa feriu a prepotência do comandante que me ameaçou com quatro dias de prisão disciplinar agravada. O facto foi comentado na Armada e considerado um acto de coragem, porque, naquela época, ter a ousadia de contestar uma ordem superior era motivo para punição.

Consequências: baixei ao hospital com diagnóstico de psiconeurose, o castigo foi amnistiado e o Serviço de Saúde foi prestigiado.

Após passagem à Reserva da Armada, concorri e fui integrado no Serviço Nacional de Saúde, em part-time. Já em exercício, verifiquei que a enfermeira-chefe negava aos utentes assistência domiciliária, alegando falta de enfermeiros. Discordei e admiti que eu podia trabalhar a tempo inteiro com horário completo. Fui despedido!

Organizei um processo e, através do Sindicato, recorri ao Tribunal de Trabalho. Após duas audiências, sem a presença de testemunhas, foi elaborada a sentença: “Readmissão a tempo inteiro, com subida de categoria e contagem do tempo perdido”.

Nesta situação permaneci 23 anos, actualizei os conhecimentos e fiz “provas públicas” na aula magna da Universidade de Lisboa para enfermeiro-chefe. O resultado (aprovação) foi publicado no Diário da República n.º 227, de 2/10/1981.

Já aposentado e nonagenário, presumi que devia diligenciar para a reposição da “Casa do Idoso”, construída pela Câmara Municipal de Lisboa, no Jardim da Estrela, para convívio da terceira idade, mas que foi roubada pelo presidente da Junta em 16 de outubro de 2016, para lá instalar um mictório a render 50 cêntimos por utilizador.

Fiz exposições a várias individualidades/entidades responsáveis e nada foi alterado. É a Democracia em que vivemos!

Nesta síntese de cem anos de vida conclui-se, sem alternativa, que a “transformação” se efetua e dela depende o destino que nos está reservado, preferencialmente e segundo creio, sem a intervenção dos seres poderosos.

* “Nada nasce, nada se cria, tudo se transforma”.

O autor desta teoria é Lavoisier (1743-1794), ilustre químico francês, que foi decapitado no tempo da Revolução Francesa (1789-1799).

9 de março de 2024

Manuel Esteves Padroso

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