“Radiações eletromagnéticas são prejudiciais à saúde das populações”
Na Assembleia Municipal (AM) de 27 de junho, foram aprovadas, por unanimidade, duas moções desfavoráveis à instalação da Linha de Muito Alta Tensão (LMAT), linha aérea dupla a 400 kV entre a subestação de Ponte de Lima e Fonte Fría (Galiza), devido aos “significativos impactos negativos na saúde pública, no ambiente, na economia local e na coesão social”.
Os grupos municipais do PS e do PSD trouxeram novamente aos trabalhos da AM o projeto que já tinha merecido, em três momentos anteriores, moções de rejeição por parte de todas as forças políticas representadas no órgão deliberativo, as quais não impediram, todavia, a Decisão de Conformidade Ambiental do Projeto de Execução, da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em fevereiro de 2024, bem como a licença de estabelecimento para a instalação da LMAT que a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) emitiu no passado dia 21 de maio.
O PS fez subir a primeiro plano os “impactos negativos” que esta LMAT acarreta devido à sua “natureza” e “dimensão”. “De acordo com o Estudo de Impacto Ambiental, o troço nacional deste projeto prevê a construção de duas novas linhas duplas trifásicas, atravessando, potencialmente, 121 freguesias dos concelhos de Ponte de Lima, Ponte da Barca, Arcos de Valdevez, Monção e Melgaço, abrangendo, portanto, um vasto território no distrito de Viana do Castelo, e afetando diretamente várias freguesias do concelho de Arcos de Valdevez”, alertou a deputada Carla Fonseca.
Na ótica do PS, “há diversos estudos que apontam para riscos na saúde das pessoas (problemas de foro neurológico, distúrbios do sono e potenciais efeitos cancerígenos)”, “danos significativos na fauna e flora locais”, “alterações drásticas na paisagem natural”, “estrangulamentos na qualidade de vida das populações devido à exposição permanente ao ruído e às radiações eletromagnéticas”, “prejuízos no potencial turístico da região” e “impactos negativos nas atividades económicas”, enumerou a porta-voz do maior partido da oposição, que se queixou ainda de “procedimentos pouco transparentes e sem consulta prévia às populações e autarquias locais”.
Em consonância, o grupo municipal do PS preconiza a “suspensão imediata da eficácia da declaração de impacto ambiental favorável ao projeto de construção da LMAT, por um lado, e a anulação do ato de licenciamento emitido pela DGEG, por outro, até que sejam realizadas novas avaliações independentes”, defendeu Carla Fonseca.
“Direção-Geral da Saúde deve ser ouvida”
O grupo municipal do PSD reafirmou, de igual modo, a sua oposição à LMAT, desde logo por ser “prejudicial à saúde dos aglomerados, razão pela qual deveria ser ouvida a Direção-Geral da Saúde, para que sejam, na medida do possível, esclarecidas e/ou acauteladas todas as questões relacionadas com a saúde humana”, exortou o deputado Luís Machado, que elencou outras objeções à LMAT.
“O traçado definido, que apresenta um conjunto significativo de incompatibilidades com o PDM de Arcos de Valdevez, atravessa espaços urbanizáveis, agrícolas e florestais de proteção ocupados ou com aptidão para habitação ou turismo. Esta LMAT ocupa mais de 1600 hectares de espaço classificado como Reserva da Biosfera pela UNESCO. A sua execução provocará uma degradação da paisagem e inutilização das áreas agrícolas ou povoamentos florestais. A passagem desta linha irá ainda ter como consequência uma desvalorização das propriedades. Enfim, a execução desta infraestrutura irá prejudicar os direitos dos proprietários ou entidades que serão afetados, direta ou indiretamente, pela sua travessia”, admitiu Luís Machado.
Já o CDS visou, particularmente, uma instituição do Estado que, “em prejuízo da comunidade”, ignorou os apelos e a oposição dos eleitos. “Apesar de os órgãos locais representativos das populações dos concelhos do Alto Minho afetados terem votado contra a LMAT, com argumentos justificativos, a APA, instituição do Estado com jurisdição na matéria, aprovou um projeto com fortes impactos no ambiente e na saúde das populações. Com esta atitude, a APA não está a defender o ambiente e as populações nem o interesse nacional”, acusou Fernando Fonseca.
Os centristas depositam, ainda assim, uma derradeira esperança na tutela. “Em boa altura, este novo Governo, através da ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, manifestou preocupação sobre o licenciamento concedido pela APA à REN, sabendo-se que o processo de anulação está a decorrer nos tribunais. Para o futuro de Arcos de Valdevez, pelas consequências funestas que esta LMAT irá trazer, é crucial que o projeto seja inviabilizado”, sustentou o antigo vereador do CDS.
“Executivo municipal contra o projeto”
Em resposta aos anseios manifestados por PS, PSD e CDS, o presidente do Município arcuense reafirmou a “oposição do executivo municipal” ao avanço da LMAT. “As câmaras de Arcos de Valdevez, Ponte da Barca, Ponte de Lima, Monção e Melgaço moveram duas ações contra a passagem desta linha, mormente uma providência cautelar em que o Supremo Tribunal Administrativo deu razão aos municípios e determinou uma revisão do procedimento. Também foi interposta uma ação contra o licenciamento, resta-nos aguardar por um desfecho positivo”, atalhou João Manuel Esteves.
Entretanto, a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, tem em mãos informação necessária para avaliar o projeto de instalação da LMAT. De resto, a governante reuniu-se no passado dia 1 de julho com os presidentes daquelas cinco câmaras.
Freguesias potencialmente atravessadas pela LMAT
Não é de agora a discussão e o desagrado em relação ao projeto da LMAT. Em 2014 e 2020, a AM de Arcos de Valdevez já tinha emitido moções desfavoráveis à travessia no território da LMAT, posição reafirmada em 2023, logo que se soube que a solução escolhida ia causar “fortes impactos negativos”, visto o empreendimento atravessar parte da freguesia de Sistelo, que é classificada de Monumento Nacional. Mas, além de Sistelo, o traçado da LMAT prevê a sua passagem em São Jorge, Ermelo, Vale, Grade, Carralcova, Ázere, Couto, Gondoriz, Vilela, São Cosme e São Damião, Sá, Álvora, Loureda e Cabreiro.
Esta é uma obra que vai requerer a construção de torres de betão, em lugares de difícil acesso, exigindo a abertura de caminhos, trabalhos que, segundo os opositores ao projeto, “ameaçam a biodiversidade e o equilíbrio ambiental existente nas freguesias atravessadas”.
Sem falsas expetativas, o presidente da Junta de Sistelo prefere não embarcar em “declarações politicamente corretas”, exigindo, pelo menos, a aplicação das eventuais compensações financeiras nas freguesias. “Quero acreditar que o projeto não vai avançar, mas, parando para pensar, a LMAT, infelizmente, vai mesmo ser construída. E, neste cenário, sou de opinião que todo o valor que vier a ser arrecadado pelo atravessamento da LMAT deve ser investido diretamente pela Câmara nos territórios que vão ser afetados por esta linha, nomeadamente os socalcos de Sistelo, um património que é do concelho e do país”, avultou Sérgio Rodrigues.
A.F.B.